Compaixão, uma virtude maçónica
Dentre todas as virtudes esperadas de um maçom talvez a mais humana, mas não por isso menos complexa, seja a compaixão. Apesar de estar intrínseca à nossa fisiologia e ter garantido a sobrevivência humana, exercer a compaixão é um trabalho diário.
A Compaixão, a Simpatia e a Empatia frequentemente são confundidas e usadas como sinónimo. No entanto, a única coisa que têm em comum a todas é que de uma forma ou outra relacionam-se ao sofrimento.
Compadecer é “sofrer com”. Quando temos compaixão, temos a virtude de compartilhar o sofrimento do outro. Não significa aprovar suas razões. Ter compaixão é não ter indiferença frente ao sofrimento do outro. É também diferente de piedade, que é sentir-se triste com a tristeza dos outros. A piedade aumenta a tristeza e a infelicidade.
Já simpatia, segundo o dicionário Priberam, é o “sentimento de atracção moral que duas pessoas sentem uma pela outra”. Já empatia é olhar com o olhar do outro, é considerar a possibilidade de uma perspectiva diferente da sua.
Porém, a compaixão tem algo de singular: ela não exige nenhuma reflexão prévia, nem argumento que a fundamente. Ela simplesmente se nos impõe porque somos essencialmente seres “compassivos”. Vamos ao encontro do outro para salvar-lhe a vida, trazer-lhe água, alimentos, agasalho e especialmente o calor humano.
Mas conseguimos ter compaixão com todos? O psicólogo Paul Condon conduziu um experimento que nos ensina que a compaixão é inerente ao ser humano e também moldada pelos outros que nos cercam. Neste estudo, os participantes deveriam primeiro resolver equações matemáticas e, posteriormente, preparar refeições para outras pessoas. O que não sabiam é que em cada sessão participavam, além dele, outros dois actores. Um deles, nomeado de Dan, trapaceava descaradamente na primeira etapa, alegando ter resolvido todos os problemas matemáticos e levando vantagem sobre os demais.
Na segunda etapa, os participantes deveriam temperar as refeições para um dos colegas de teste. Propositalmente, o colega que recebia as refeições era sempre o trapaceiro, Dan. O resultado foi impressionante: a grande maioria dos participantes adicionou quantidades altas de pimenta extraforte para que Dan provasse e assim, não ganhasse a recompensa prometida aos que comessem tudo.
A surpresa, entretanto, veio em uma variação da segunda etapa. Antes de os participantes prepararem a refeição de Dan, eles conversavam com a outra actriz, Hannah. ela, em lágrimas, contava que o irmão estava internado em estado terminal e que estava sofrendo muito. Este simples acto fez com que os participantes ao prepararem a refeição fossem muito mais contidos, usando pimentas fracas para o “trapaceiro”. Ou seja, foram tomados de compaixão mesmo que vinda de um terceiro.
O estudo do professor Condon foi repetido várias vezes com pequenas variações. Em algumas, o pesquisador, também actor, era extremamente gentil com os participantes. Em outros, a recepção ao centro de pesquisa era feita com frutas e água fresca. Os resultados, no entanto, não variaram. A compaixão continuava sendo contagiosa.
Outro estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Wisconsin-Madison mostra que a compaixão pode ser treinada através da meditação da compaixão, uma técnica budista antiga. A pesquisa envolveu o treinamento de jovens adultos para meditar sobre sentimentos de compaixão pelos outros, incluindo entes queridos, estranhos e até pessoas difíceis.
Numa experiência para testar os efeitos do treino de compaixão, os investigadores criaram um cenário onde os participantes jogavam um jogo chamado “Jogo da Redistribuição”. Imagine uma situação em que alguém (o Ditador) divide dinheiro injustamente com outra pessoa (a Vítima). Depois de testemunharem esta injustiça, os participantes tiveram a oportunidade de usar o seu próprio dinheiro para ajudar a Vítima. O estudo descobriu então que aqueles treinados em compaixão estavam mais dispostos a doar seu próprio dinheiro em comparação com um grupo de controle. Isto sugere que o treinamento da compaixão pode cultivar um comportamento altruísta.
Exames cerebrais também revelaram mudanças nas regiões do cérebro associadas à empatia, regulação das emoções e emoções positivas no grupo de meditação da compaixão.
A compaixão é o sentimento que surge naturalmente quando você aprende sobre o sofrimento do outro. E isso motiva você a querer fazer algo para ajudar. Longe de ser apenas uma gentileza social, a compaixão tem um grande propósito evolutivo: os descendentes humanos são os mais dependentes e vulneráveis de qualquer espécie e precisam de mais cuidado dos outros para sobreviver. Ao longo do tempo aprendemos que iríamos mais longe se cuidassem daqueles que se parece connosco. Se os ajudássemos e protegêssemos. Simplificando: sem compaixão, não sobreviveríamos.
O maçom deve estar atento para os males da sociedade. Ele não pode ignorar o sofrimento do próximo, pois o nosso comprometimento é com a felicidade da humanidade. Juramos construir templos às virtudes e cavar masmorras aos vícios. Trabalhar de forma Justa e Perfeita. E a compaixão nada mais é do que um sentimento humano de quem se incomoda com a infelicidade alheia, pois deseja a felicidade da humanidade. Como escreve Kennyo Ismail, “Compaixão é um sentimento próprio do Maçom, que faz parte do seu ser enquanto houver injustiças no mundo. É o seu combustível e o mobiliza para seu objectivo como Maçom”.
Fábio Serrano, M∴M∴ – RL Mestre Affonso Domingues nº5 (GLLP / GLRP)
Maio de 6024
Bibliografía
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