A interpretação e significado dos símbolos maçónicos
Hermann Rorschach foi um psiquiatra suiço que viveu entre 1884 e 1922, e que ficou conhecido pelo seu trabalho sobre o significado psicológico de interpretações dadas a manchas de tinta, tendo desenvolvido para isso uma técnica que tomou seu nome: o teste de Rorschach. Este teste baseia-se na chamada “hipótese projetiva”, de acordo com a qual a pessoa a ser testada, ao procurar organizar uma informação ambígua (ou seja, sem um significado claro, como as pranchas do teste de Rorschach), projeta aspectos da sua própria personalidade. O intérprete (ou seja, o psicólogo que aplica o teste) teria assim a possibilidade de reconstruir os aspectos da personalidade que teriam levado às respostas dadas. Dito de outro modo: confrontado com um objeto sem um significado previamente estabelecido, o sujeito atribui-lhe uma conotação, uma semântica, um sentido que decorre, essencialmente, de si mesmo, não tendo que ser – e frequentemente não sendo – uniformes e invariáveis os significados atribuídos de um sujeito para outro.
Algo de semelhante sucede na maçonaria com os símbolos. Há símbolos a que se atribui significados convencionados – como o esquadro que, servindo para traçar ângulos retos, evoca a retidão de caráter – o que não impede que lhes sejam atribuídos outros significados. Outros símbolos traduzem uma maior diversidade de sentidos – como o G que a maçonaria regular coloca entre o esquadro e o compasso. Símbolos mais obscuros, menos frequentes e de menor universalidade são por vezes encontrados num contexto maçónico, mas poderão ser apenas percetíveis e utilizados num determinado contexto cultural, no âmbito de certo rito, ou confinados a um perímetro geográfico específico. Contrariamente ao teste de Rorschach, todavia, o recurso à simbologia pela maçonaria não tem o fim de constituir qualquer análise psicológica ou psiquiátrica por um terceiro, mas apenas de cada um por si mesmo.
A simbologia maçónica – que tem como tema dominante a maçonaria operativa medieval, a que hoje chamaríamos arquitetura ou engenharia civil – tem o triplo propósito de estabelecer uma estrutura e um contexto cultural para os arquétipos universais que identificam a maçonaria, uma forma sintética de comunicação de conceitos, e uma cultura de heterogeneidade e tolerância. Cada símbolo maçónico – normalmente coisas tão banais como uma pedra ou uma colher de pedreiro – evoca um ou mais significados que, no seu conjunto, constituem uma matriz semântica que dota a Ordem de um contexto cultural que, por sua vez, enquadra e dá corpo aos conceitos e princípios que a maçonaria pretende transmitir, propagar e perpetuar. Fica assim estabelecida, em torno dos símbolos, uma linguagem que, de forma sintética, permite a rápida e eficaz evocação, relacionamento e comunicação de conceitos, bastando por vezes uma simples palavra para transmitir um conceito complexo no seu contexto adequado. Por fim, ao não fazer corresponder de forma imposta, rígida e imutável os símbolos aos conceitos, a simbologia maçónica permite que cada maçon atinja as sua próprias respostas às importantes questões filosóficas que a vida coloca.
Contudo – e isto é a minha interpretação pessoal, que vale o que vale – a maior virtude do recurso à simbologia e à alegoria consiste no distanciamento que estabelece entre os princípios e a sua aplicação. Este distanciamento possibilita que a interiorização dos conceitos decorra da sua aplicação a um sujeito abstrato (e, mesmo, claramente do foro do mítico e do imaginário), e que só uma vez absorvida a sua essência e apercebidas as consequências da sua incorporação no edifício ético e moral individual – o que pode levar mais ou menos tempo, ou nunca suceder de todo – cada um aplique então a si mesmo o significado pessoal e personalizado que atribuiu ao símbolo, interiorizando-o e consolidando-o da forma que entende ser a que mais se adequa à sua própria realidade e, por fim – porque, em maçonaria, nada se ensina mas tudo se aprende – tire partido da lição que deu a si mesmo.