Regra particular
Cada agrupamento humano institui as regras que lhe convêm. Por vezes, uma instituição adota uma regra que normalmente não é adotada, que muitas outras não consideram boa – mas que se revela adequada à instituição que a adota, em função das suas particularidades.
Na GLLP/GLRP, desde a sua fundação, vigora uma regra que não é comummente adotada – e que não creio que fosse saudável a sua adoção generalizada. Essa regra postula que, no processo eleitoral para a eleição do Grão-Mestre, efetuada a votação e contados os votos, apenas seja divulgado quem foi eleito Grão Mestre, não se divulgando o concreto resultado quantitativo da eleição – isto é, o número de votos recebido por cada candidato. Mais, os elementos que integram a assembleia de apuramento dos resultados – composta pela Comissão Eleitoral e pelos candidatos ou seus representantes – ficam obrigados a rigoroso dever de sigilo quanto a esse resultado quantitativo.
Esta regra evidentemente não é adequada para a generalidade dos casos. Na maior parte das eleições, a exigência de transparência impõe que sejam pormenorizadamente divulgados os resultados apurados. Porquê então esta regra, neste particular caso? Porquê a falta de preocupação com a transparência?
A resposta está em que, por um lado, a necessidade de zelar pela transparência é aqui reduzida e, por outro, um outro valor se procura defender.
A necessidade de transparência é neste caso reduzida, atento o universo de votantes e de interessados. Votam para Grão-Mestre todos os Mestres da GLLP/GLRP. Ser Mestre Maçom pressupõe uma elevação ética, a ser constantemente exercida, que impede que haja fraude eleitoral. Mais: que torna impensável a possibilidade de fraude eleitoral. A genuinidade e honestidade do processo – e a fiscalização do seu decorrer – está garantida pelo respeito que merece a Comissão Eleitoral e a confiança que todos depositam na sua imparcialidade, além de, obviamente, o apuramento dos resultados ocorrer na presença e sob fiscalização dos candidatos ou seus representantes. Todos sabem que o candidato que for anunciado como tendo sido eleito é aquele que, sem margem para dúvidas ou suspeitas, recolheu mais votos. Isso é ponto assente!
Assim sendo, a divulgação quantitativa dos resultados apenas serviria para satisfazer a curiosidade. A não divulgação quantitativa dos resultados protege um outro valor: a imagem, a valia, o potencial futuro do ou dos candidatos derrotados! Pouco importa a dimensão da vitória do candidato escolhido. Não esqueçamos que a dimensão da vitória do escolhido é diretamente proporcional à dimensão da derrota do ou dos preteridos…
O processo de votação para eleição de Grão-Mestre potencia probabilidades de existência de resultados desnivelados. Todos os Mestres dispõem de um voto, mas o voto é exercido pelos Mestres nas suas Lojas, em sessões especificamente convocadas para a eleição. O forte cimento que liga os obreiros de uma Loja entre si, o hábito da busca e obtenção de consensos, potencia as possibilidades de cada Loja ter votações muito fortes, quiçá unânimes, ou quase, no candidato em relação ao qual na Loja se gerou consenso no sentido do seu apoio. Isto gera a tendência de – salvo quando haja porventura significativa divisão entre Lojas quanto à escolha do candidato a eleger – para que o resultado quantitativo seja uma votação muito significativa, quiçá esmagadora, no candidato eleito.
E, no entanto, a significativamente menor expressão eleitoral do ou dos candidatos derrotados não implica a sua menor valia. Sobretudo, não implica que não seja ou sejam capazes ou merecedores para exercer o ofício de Grão-Mestre. Significa apenas que, naquele particular momento, a escolha recaiu noutro. Tão só.
Ao não se divulgar resultados quantitativos, protege-se a igualdade qualitativa dos candidatos. A votação não escolheu um em detrimento de outro ou de outros porque aquele era bom e este ou estes eram maus. Escolheu-se de entre vários Irmãos a quem foi reconhecida capacidade para o exercício do cargo – e por isso beneficiaram da proposta de vários Mestres – um para o exercer. Aquele que, naquele momento, se entendeu ser o que teria condições para melhor exercer a função. Tão só. O que não quer dizer que, na eleição seguinte, o ou um dos derrotados desta eleição não possa vir a recolher o apoio para ser, por sua vez e então, eleito.
Ter sido candidato derrotado não inviabiliza ou dificulta eleição posterior. Mas ter sido candidato copiosamente derrotado pode dificultar muito essa possibilidade e, quiçá injustamente, quiçá com prejuízo para a instituição, liquidar as possibilidades futuras de eleição de um bom candidato que, em determinado momento, defrontou e perdeu perante outro que foi então considerado mais bem colocado para exercer o ofício, em detrimento de, possivelmente, um menos bom candidato que beneficiaria de não ter sofrido anteriormente copiosa derrota… apenas porque não se apresentou à eleição.
Em eleições maçónicas, não há vencedores nem vencidos. Há apenas os que são escolhidos e os que, naquele momento, o não são. Aquele que foi preterido numa escolha eleitoral não deve ficar, de forma alguma, diminuído para o futuro. Essa preterição não significa que não tenha capacidade ou merecimento para o exercício da função. Significa apenas que, naquele momento concreto, se entendeu haver outro um pouco mais bem qualificado ou um pouco mais merecedor de a exercer. E a diferença de valia, naquele momento, entre ambos, pode ser muitíssimo menor, do que a expressão eleitoral quantitativa resultante de uma votação.
Não é comum, sabemos, esta regra. Mas é uma regra que protege e salvaguarda os preteridos numa votação, mantendo incólumes as suas possibilidades no futuro. E isso já sucedeu! Já foi eleito um candidato que, na eleição anterior, tinha sido preterido em favor de outrem. Sem problemas: a generalidade dos votantes não sabia se, nessa eleição, fora preterido por curta margem ou copiosamente batido na escolha. A eleição subsequente não foi, assim, perturbada por um elemento que – manifestamente – não fez falta nenhum para a escolha então efetuada.
Esta regra que mantemos entre nós, na GLLP/GLRP, não é – sabemo-lo bem – suscetível de ser comummente aplicada. Mas atrevo-me a pensar que o mundo será um pouco melhor se e quando puder sê-lo, sem problemas…
In Blog “A Partir Pedra” – Texto de Rui Bandeira (27.10.2010)