Do Um

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Há dias, numa troca de correspondência electrónica, o meu interlocutor interrogava-se e interrogava-me sobre os eventuais limites ou requisitos mínimos que a Maçonaria Regular colocasse na, para ela indispensável, crença num Ser Supremo. E, indo mais longe, interrogava-se e interrogava-me sobre diversas características ou concepções da Divindade que vira na Wikipédia e se seria admitida uma concepção fluida que considerasse o Universo, ou a Energia, como Deus. No fundo, fazia, de forma mais rebuscada a pergunta que toda a Humanidade faz ao longo dos tempos: Quem ou o que é Deus, qualquer que seja o nome que se lhe dá, Ser Supremo, Criador, Grande Arquitecto do Universo, etc.?

Enviei-lhe a minha resposta. Relendo-a, achei que valeria talvez a pena deixá-la também aqui.

Não há autoridade que fixe “requisitos mínimos” para o Ser Supremo, obviamente. Até porque, a haver, teria que ser mais “suprema” que o “Supremo”… As características do Criador são as que Ele tem e que nós não sabemos quais são. Esse é parte do Mistério da Vida e da Criação…

Todas as características que viu na Wikipédia são elocubrações humanas, cada uma tão válida ou tão errada quanto a anterior.

A concepção do Criador que cada um tem é tão válida como a do parceiro do lado.
Em termos de Maçonaria, no meu entender, o que divide a corrente Regular da Liberal é a aceitação desta de ateus.

E essa diferença torna-se crucial na medida em que dela depende a razão por que se trabalha e se busca o aperfeiçoamento.

Se se é crente, então procura-se seguir o Caminho Ético determinado ou que decorre do Plano e do Objectivo da Criação. Porventura como condição necessária para uma repurificação que permita a reunificação estrutural com o Princípio Criador – o que equivalerá à Vida Eterna, ao Paraíso, enfim, às várias formas de “recompensa” que as várias religiões apresentam.

O Maçon Regular procura aperfeiçoar-se para se transcender, para se aproximar do nível superiormente ético da Divindade. Busca a superação do humano na direcção do divino. E “assim se vai da lei da morte libertando”, assim não teme a Morte, etapa da Vida como o Nascimento, o Crescimento, a Maturidade. Assim crê que a Morte não é o Fim e que depois algo há. Porventura não sabe o quê, mas sente, intui, acredita que quanto mais eticamente se tiver purificado e aperfeiçoado, mais bem preparado estará, chegada a altura, para cumprir mais essa outra etapa do Ciclo da Vida e da Criação.

O ateu, porque não crê na Divindade, acredita que a Morte é o Fim e que a Vida não tem outro sentido do que passar por aqui enquanto aqui se está. Então o seu sentido ético só existe na medida em que tem utilidade ao passar e estar por aqui. É um sentido ético utilitário.

Daí o eu entender que a Maçonaria Regular e a Liberal seguem o mesmo Caminho, mas a Maçonaria Regular vai mais além do que a Liberal.

Agora, não tenho eu, nem nenhum maçon, o direito de “determinar” como é a Divindade, quais as suas características, etc. Pela simples razão de que não Sei, só Creio. E não há razão para a minha Crença ser melhor do que a de qualquer outro. Daí que o que importa é que haja Crença, que se acredite na Vida para além da Morte e que se busque o significado da Criação e da Vida, procurando transcendermo-nos das nossas humanas limitações. Um pouco que seja.

A Maçonaria Regular é um espaço aberto a todos os crentes, independentemente da sua crença. A Maçonaria Liberal é um espaço apenas ético. A Maçonaria Regular é isso e algo mais.

Se se acredita que o Universo é Deus, então, como fazemos parte do Universo, nós somos parte de Deus. Resta saber que parte… Trabalhemos então para não ser meros detritos orgânicos da Divindade, radicais livres a esmaecerem a Sua pele e procuremos antes ser moléculas úteis…

Rui Bandeira

Publicado no Blog “A partir pedra” em 12 de Fevereiro de 2008

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