5 de Outubro, revolução e maçonaria
Não pode deixar-se passar a data de 5 de Outubro – aniversário da implantação da República em Portugal – sem se falar na Maçonaria. É público e conhecido o papel que a maçonaria teve neste evento. De facto, a revolução não só terá sido promovida, arquitetada e executada – pelo menos em parte – por maçons, como a maçonaria terá na mesma participado ativamente de forma institucional.
O que poucos saberão é que tal modo de atuação é daqueles que distingue a Maçonaria Regular da Maçonaria Liberal. Não se questiona o mérito da causa, mas a forma e os meios utilizados. De facto, as razões invocadas para a revolução – o despotismo político-religioso, a ausência de liberdade de culto e da liberdade de consciência que se viviam no regime de então – são válidas e meritórias, e pode mesmo dizer-se que pertencem ao ideário maçónico. Todavia, algumas questões de fundo separam inexoravelmente as duas correntes da Maçonaria – Regular e Liberal – e podem ser apreciadas neste contexto.
Por um lado, tomemos a questão da discussão de política e religião em loja. Pelo que se sabe, esta revolução – como outras – foi preparada durante sessões de loja. Forçosamente se discutiu o mérito desta política sobre aquela e – sabendo-se que havia maçons quer na fação republicana quer na monárquica – certamente houve vozes minoritárias que viram os seus Irmãos, a sua Loja, e mesmo a sua Obediência, agirem como um corpo na prossecução de objetivos e de ideias contrários aos seus. Por fazer prevalecer, na escala dos valores, a harmonia fraterna, é que a maçonaria regular proíbe essas discussões, para que não se estabeleçam partidos opostos dentro das lojas, para que estas não escolham lados, e para que as grandes lojas não manifestem preferências que poriam, em qualquer dos casos, uns “de dentro” e outros “de fora”.
Por outro lado, atente-se a que a maçonaria regular exige dos seus membros que sejam cidadãos cumpridores das leis do país. Ora, esta questão tem duas consequências. Por um lado, de forma mais imediata, implica que caso um maçon seja condenado pelo sistema judicial civil por um crime que tenha cometido, sofrerá quase que por certo uma sanção disciplinar no seio da sua Obediência, sanção essa que poderá mesmo constituir a sua expulsão (mas, evidentemente, ninguém é expulso por algo como uma multa de estacionamento). Por outro lado, esta exigência reflete-se nas Obediências, não sendo reconhecidas a nível internacional aquelas que, para existirem, impliquem que os seus membros cometam algume ilegalidade; por exemplo, se as leis do país passarem a proibir a Maçonaria, e mesmo assim uma Grande Loja continue a existir – cometendo uma ilegalidade – ser-lhe-á retirado o reconhecimento internacional por parte das outras Grandes Lojas regulares.
Tais condicionantes – a proibição de discussão política e religiosa, e a obrigação de cumprimento da lei do Estado – não se verificam na Maçonaria Liberal. Cada maçon que pertença a uma Obediência da Maçonaria Regular é livre de agir como a sua consciência lhe dite e continuar a ser maçon – desde que não cometa nenhum crime. Participar de – e, especialmente, promover – uma revolução, atentando contra os órgãos do Estado, é um crime contra o mesmo Estado, e não é considerado pela Maçonaria Regular uma forma aceitável de se agir. Entendimento diametralmente oposto tem a Maçonaria Liberal, que argumenta que uma lei injusta não tem legitimidade, que crime seria observá-la, e que promove o seu derrube.
Dois pontos de vista.
Duas formas de agir.
Duas Maçonarias.