Maçonaria e Poder (XIV)

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Este já longo conjunto de textos teve como objetivo mostrar, serenamente e com o máximo de objetividade que me foi possível, como, ao longo do tempo e em diversas latitudes, se processou o relacionamento entre o Poder e a Maçonaria. Espero que os de boa-fé (os outros não me interessam – ladrarão sempre à passagem da caravana…) tenham ficado com um pouco mais de informação que lhes permita enquadrar e ajuizar sempre que um qualquer político demagogo mande umas “bocas” sobre a a “atividade escondida” da Maçonaria ou um periódico sensacionalista decida vender algum papel ou conquistar uns pontos de audiência “desvendando” que A, B ou C é maçom, que D, E ou F se reúnem no local X, Y ou Z ou que G, H ou I pertencem a partidos diferentes e afinal são “Irmãos” da mesma Loja.

Desmontar a demagogia, desdenhar do sensacionalismo, não significa, não passa, não pode passar (sob pena de se trair os princípios que os maçons defendem) pela mentira ou por esconder o que quer que seja. Pode passar, e tem passado, por não se conceder importância às atoardas, demagogias ou simples exposição de verdades, meias-verdades e especulações inverídicas, com objetivos sensacionalistas, não se lhe dando a dignidade de uma resposta, primando pelo silêncio mais ensurdecedor possível. Tem sido esta a postura da Maçonaria, para o bem e para o mal, quase sempre prudentemente bem, aqui e acolá deixando medrar o mal da intriga, da insinuação, da descarada mentira demagógica.

Na minha opinião. a resposta adequada da Maçonaria deve passar também pelo esclarecimento, pela confiança na inteligência das pessoas, pela informação objetiva que permita aos de boa-fé formularem os seus juízos, sem ser apenas com base nas atoardas e nas tiradas demagógicas.

E isso passa por assumir a História da Maçonaria e o seu relacionamento com o Poder, no seu melhor e no seu pior; nos seus bons, como nos seus maus momentos. Foi o que procurei fazer ao longo desta série de textos.

A melhor forma de desmontar a demagogia e de relativizar sensacionalismos é, afinal, mostrar o que a Maçonaria é: uma instituição mais que tricentenária, com propósitos meritórios, com presença tendencialmente global, mas organizada em estruturas nacionais e núcleos independentes locais, que sociologicamente tem mais elementos pertencentes a estratos privilegiados ou relativamente confortáveis da sociedade do que dos estratos que vivem com dificuldades (só depois de se garantir adequadamente a subsistência e um mínimo de conforto, para si e para os seus, é que o homem está verdadeiramente disponível para algo para tantos tão abstrato como preocupar-se com o seu aperfeiçoamento moral e espiritual…) e que, como todas as instituições que atingem algum relevo social, obviamente que interage e influencia os atores do Poder e é influenciada por estes.

As recorrentes referências à pretensa influência escondida da Maçonaria sobre o Poder só podem ser por todos relativizadas se e quando se compreender que a Maçonaria tem precisamente (nem mais, nem menos) a mesma influência sobre o Poder (e que, correlativamente, é por ele influenciada) que têm as outras instituições de relevo na Sociedade.

O múnus de uma Igreja (de qualquer religião) é de natureza espiritual. Mas, assumindo as Igrejas, particularmente a Igreja hegemónica numa qualquer região, indiscutível relevo na sociedade em que se inserem, só por cândida ingenuidade se pode não se dar conta de que as Igrejas (ou, pelo menos, a Igreja hegemónica) exercem influência (que, por alheia ao seu objetivo principal, de natureza espiritual, se pode classificar de “escondida”) sobre o Poder.

A razão de ser das Universidades é a investigação nos mais variados campos do Saber humano e a transmissão desse Saber. Mas alguém duvida que as Universidades, os professores universitários, influenciam decisivamente o Poder (seja em estudos, seja em conversas de gabinete, seja fornecendo pessoal político)? No entanto, o campo de atuação das Universidades é o Saber, não o Poder, pelo que as influências daquelas neste campo podem ser classificadas de “escondidas” ou “ínvias” ou “indevidas”.

As instituições de solidariedade social são (e em tempos difíceis ainda mais) indispensáveis no apoio aos menos afortunados. Os Estados não conseguem, não podem (cada vez podem menos…) tudo fazer e, muitas vezes, a diferença entre o caos social e um mínimo de dignidade proporcionado a quem dificilmente sobrevive está na meritória ação das instituições de solidariedade social. Mas alguém que não seja incuravelmente ingénuo tem dúvidas que esse papel indispensável traz consigo alguma força de influência sobre os Estado e os seus atores?

A economia de um país depende de forma não negligenciável dos seus empreendedores, dos seus empresários, das suas estruturas financeiras, e do emprego e do desenvolvimento que possibilitam. Alguém duvida do poder de influência junto dos decisores políticos dos capitães de indústria e dos financeiros e das organizações em que se juntam?

Sem trabalhadores e o seu labor, não há produção, não há riqueza, não há sociedade viável. Alguém duvida que os sindicatos e as centrais sindicais influenciam o Poder? Claro que há épocas e épocas. Períodos em que os ventos sopram mais a favor dos sindicatos e períodos de refluxo. A vida é feita de ciclos e os ciclos a todos atingem.

E poderia continuar a dar exemplos de estruturas que influenciam o Poder, desde o desporto, à escola, aos artistas, às classes profissionais, à comunicação social, e por aí fora.

O Poder – felizmente ! – há muito que deixou de ser absoluto. Mas que ninguém seja ingénuo: mesmo quando o Poder era absoluto não deixava de ser influenciado por quem tinha capacidade e meios para exercer essa influência… Por maioria de razão, nas sociedades modernas, o Poder é exercido em resultado de um complexo sistema de influências cruzadas, opostas, conflituantes. Entre o projeto do governante, a sua convicção do que deve ser feito, e o que efetivamente é concretizado vai a distância do sonho à realidade, concretizando-se o que é possível, em cada momento, em face dos interesses – e respetiva força naquela ocasião – que, normalmente de uma forma surda, se digladiam junto do Poder.

A Maçonaria é uma instituição como as outras. E, como todas as outras, dá o seu contributo para a complexa teia social que influencia o exercício do Poder nas cada vez mais complexas sociedades modernas. Negá-lo seria estúpido. Afirmá-lo não tem nada de mais.

Esgrimir com a influência da Maçonaria (insinuando que nenhuma esta componente social deveria ter) é uma forma de mandar poeira para os olhos dos ingénuos. Todas as instituições sociais influenciam o Poder. E todas as influências são exercidas, por vezes publicamente e muitas mais vezes de forma reservada, resguardada, no silêncio e no conforto dos gabinetes – que ninguém se iluda!

A Maçonaria tem exatamente a quota-pare de influência que deve ter, que naturalmente cada instituição minimamente relevante na Sociedade tem. Nem mais, nem menos. Que influência? Em que sentido? Os valores que a Maçonaria defende, as suas divisas, são conhecidos: Liberdade, Igualdade, Fraternidade, Sabedoria, Força, Beleza. O nosso “negócio” é do campo da ética. Quem dera que todas as influências sobre o Poder se situassem neste campo…

Rui Bandeira
Publicado no Blog “A partir pedra” em 19 outubro 2011

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1 Response

  1. António Azevedo diz:

    Os textos e a sábia reflexão sobre os temas tratados e dados à Luz neste seu blogue, são de excelente qualidade e fonte de grande aprendizagem para quem, como eu, pretender evoluir na Arte Real.

    Por isso um bem-haja e muitas felicidades…

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